sábado, 22 de junho de 2013

TRILOGIA DA DEPRESSÃO: A NOITE ESCURA DA ALMA II

     A noite escura da alma é o título do poema escrito pelo místico cristão São João da Cruz .Refere-se à crise na jornada da vida,a perda da fé, o vazio,o caos e o colapso.Para alguns é um momento vivido na vida,para outros é quase o tempo de uma vida inteira.Para São João da Cruz durou 45 anos.Pra ele a experiência da noite escura da alma está relacionada a depressão no sentido de adoecer e transformar-se.

     Quem ,de vocês, já atravessou a noite escura da alma? De repente,não tem mais força nem poder para reger sua vida nem suas obrigações.Fica a espera de que alguém ou algo de fora o salve.Perde a energia, o brilho,sente-se indefeso,só resta aceitar o que lhe vem e suportar a horrível situação.Não adianta perguntar "por que eu?"É a queda no vazio,no limbo,no abismo ou a beira do precipício.É um sofrimento forçado que não pode fazer nada para livrar-se.De noite para o dia tudo muda,não sabe se terá futuro,não sabe no que acreditar,todos os bens e dedicação de vida se restringem ao nada,está imobilizado pelo ocorrido,pela doença,pela decepção.O sentimento de impotência é  extremo,tudo é só seu e de mais ninguém,são becos sem saídas,doença graves que ameaçam a vida física e psiquica.


     O primeiro passo para atravessar a noite escura da alma é não ter medo.O medo nos divide e nos enfraquece.Deve-se fazer o que é preciso para melhorar,este  é o nosso dever e escolha que envolve algum sacrifício e submissão ao destino atual.Se vivemos até aqui dirigindo a nossa vida,é chegado a hora que devemos aceitar uma ajuda que nos guie e também  aceitar que nada mais será como era antes.A mansidão com determinação de mellhorar chama pra si a cura.

     A noite escura da alma traz consigo um novo mundo pra viver ainda nesta vida aqui,devemos nos livrar da exigência de que outros ou Deus façam por nós o que é nosso dever.A noite escura da alma não é sempre uma vivência negativa.Também não é uma exigência de provar alguma coisa pra alguém.Sofre-se porque é sensível,não porque é culpado.
   
     Rosângela Ribeiro
 

TRILOGIA DA DEPRESSÃO: QUEM DISSE QUE A DEPRESSÃO É SEMPRE RUIM? I

     Somos uma sociedade depressiva ou submetida à ditadura da felicidade?
     Quem não está feliz,está deprimido?   Sofrer é doença?   Se não consumo como a mídia pede, se não sou a melhor, a  bonita, a magra, a  inteligente, a  popular, a amada, a bem sucedida,a com dinheiro,muitas bolsas e sapatos,a compreendida e/ou a escolhida, devo ser a deprimida?
     Como viver com o confronto da minha banalidade, da minha rotina simplória, da minha inteligência e memória medianas, do meu envelhecimento sem grandes saltos que não sejam para o ganho de peso, os cabelos brancos, a menopausa,o cansaço, a artrose e o marido que de príncipe virou sapo?
     Poucos sabem diagnosticar clinicamente os transtornos mentais do Eixo I mas todos "sabem" diagnosticar a depressão em si mesmo e nos outros.Numa sociedade em que temos que suportar tudo, ,gostar de tudo,amar a todos,sermos amadas por todos,estarmos sempre dispostas,sempre produtivas e nos sentirmos sempre jovens e úteis, não é difícil fazer o "diagnóstico" de depressão.Pois,deprimido é aquele cuja vontade é nada disso e nossas questões existenciais se vêem escritas nos testes diagnósticos de revistas de banca de jornal e sites para posterior consumo enriquecedor das indústrias farmacêuticas.
     Diagnosticar a depressão  apenas a partir dos sintomas:não durmo bem, tenho chorado demais,ando sem vontade...é como tirar um espinho do pé sem procurar saber quem caminha,por onde  anda e como se anda;  promovendo ao espinho toda a  responsabilidade pela dor e sofrimento.
    Alguns historiadores e sociólogos dizem que existem para as pessoas sete necessidades universais: subsistência,proteção,afeto,compreensão,participação,lazer e criação.Com a evolução histórica e social surgiram, posteriormente, duas outras necessidades:a de identidade e liberdade. Observo que a partir do final do século XX quem não está ok com uma destas sete necessidades se diz deprimido e deseja medicação..Também a irritação,preocupação,dívidas,desemprego,frustrações,pessimismo,diminuição do desejo sexual,o luto e abandonos são sempre "transtornos" e devem ser medicados.  
     Será que toda  tristeza deve, imediatamente, ser eliminada porque a tristeza é desnecessária,inútil,só leva ao sofrimento e a outras doenças? Não é o que dizem Baden Powell e Vinícius de Moraes no SAMBA DA BÊNÇÃO, "A alegria é a melhor coisa que existe,é assim como a luz no coração.Mas pra fazer um samba com beleza,é preciso um bocado de tristeza,senão não se faz um samba não".   
     Medicar a tudo,é o no mínimo,desespero do paciente e imprecisão diagnóstica do médico.E de ambos,a  descrença de que na relação  médico-paciente  e paciente-família-sociedade  possa alcançar a produção de algum sentido à tristeza e transformação pessoal,assim como o  fortalecimento psíquico  à dor emocional  inevitável que faz parte do nosso existir.
    
    Rosângela Ribeiro